Fim de gargalos requer mudança estrutural, dizem especialistas

07-06-2017

As filas de caminhões parados nas estradas em direção ao litoral paulista e as dezenas de navios ancorados em frente às praias de Santos, situações vistas no primeiro semestre de 2013, têm grande probabilidade de ocorrer também neste ano. A safra a ser escoada agora deve crescer, mas a capacidade estrutural para transportá-la continua a mesma que a utilizada na última produção agrícola.

Governo, autarquias e empresas fizeram planos para minimizar o risco de um novo apagão logístico em 2014, mas de acordo com especialistas, a resolução definitiva do problema só ocorrerá com uma mudança estrutural na cadeia logística brasileira, e vai demorar anos para isso acontecer.

O Brasil deverá produzir 196,67 milhões de toneladas de grãos na safra 2013/14, um aumento de 5,2% em relação à colheita passada, de 186,9 milhões de toneladas, segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), em seu quarto levantamento divulgado na semana passada. Isso significa cerca de 9 milhões de toneladas de grãos a mais, suficientes para encher 122,6 mil vagões de trem, se levada em conta uma média de 80 toneladas por carro. Ou pelo menos 306 mil viagens de caminhões com 32 toneladas cada.

Entretanto, a malha ferroviária, a estrutura portuária e a capacidade de armazenamento no campo apresentaram poucos avanços para diminuir os gargalos logísticos do País desde a colheita mais recente.

"A discussão sobre o risco de apagão na logística da safra se repete todo final de ano", diz o especialista em negócios portuários da Katálysis Consultoria e Empreendimentos, Frederico Bussinger. "A estrutura portuária e, principalmente, dos acessos aos portos e da capacidade de armazenagem no interior do País continua a mesma", afirma o especialista e sócio da Agência Porto Consultoria Fabrizio Pierdomenico. "Enquanto não desenvolver outros modais de transporte, o País ainda passará durante mais alguns anos por uma situação muito parecida com a do primeiro semestre de 2013", avisa o diretor-executivo da consultoria HRM Logística, Hélio Meirim.

No último dia 11 de dezembro, a Secretaria de Portos (SEP) lançou um pacote de medidas para evitar a repetição, neste ano, das filas quilométricas de caminhões nas estradas que levam ao Porto de Santos. Entre as medidas anunciadas, estão um sistema de agendamento que vai sincronizar a chegada de navios e caminhões chamado Portolog, a eliminação de cruzamentos entre ferrovia e rodovia, as conclusões da dragagem do Porto e das avenidas perimetrais e a construção de um novo acesso de caminhões na Margem Esquerda, em Guarujá, que será bancado pelos próprios terminais.

Longe de serem novidade, os projetos do Governo retomam ações anteriormente previstas. "As propostas da avenida perimetral e do acesso ferroviário estão no Plano de Desenvolvimento e Zoneamento (PDZ) de 1997", conta Bussinger. "São boas propostas, mas elas já vinham sendo pensadas e discutidas há muito tempo", completa.

O agendamento, de acordo com os especialistas, é uma alternativa para otimizar a infraestrutura no transporte da produção agrícola nacional. Mas o resultado é limitado. "Grandes volumes precisam ser movimentados de maneira eficaz, e nem sempre a melhor solução é o modal rodoviário", diz Meirim, da HRM Logística. Para ele, o País precisa abrir novos corredores de exportação para desafogar o litoral paulista no pico de escoamento da safra do Centro-Oeste, março, abril e maio.

Iniciativa privada
Um caminho alternativo para o litoral é uma aposta da VLI, subsidiária de logística da Vale que opera em cinco malhas de linha férrea no País. De acordo com o diretor comercial, Fabiano Lorenzi, o plano para os próximos quatro anos é capacitar novos corredores de exportação, um deles até o Porto de Tubarão (ES). Os investimentos que a empresa fez desde o ano passado buscam atingir ganhos de produtividade na malha, como pátios de cruzamento e aquisição de locomotivas e vagões mais eficientes. "Não há como adicionar capacidade no sistema no curto prazo", disse o executivo.

No ano passado, a logística de exportação dos produtos agrícolas sofreu com problemas operacionais nos portos do Sudeste, principalmente em Santos. Como a eficiência das ferrovias depende da produtividade portuária, quando uma ponta apresentou problemas, a concessionária ferroviária América Latina Logística (ALL) reportou queda nos volumes transportados no segundo e no terceiro trimestres.

Agora, os terminais portuários atendidos pela empresa estarão normalizados e a companhia espera crescimento de seu projeto de R$ 880 milhões em Rondonópolis (MT), inaugurado em setembro. "A ALL espera capturar em 2014 os volumes que deixamos de transportar em 2013", diz o diretor financeiro e de Relações com Investidores da companhia, Rodrigo Campos.

Concessões
O aumento da capacidade da infraestrutura de exportação da safra agrícola só será observado efetivamente após a realização das concessões ferroviárias e portuárias planejadas pelo Governo. Ambos os processos enfrentam questionamentos no Tribunal de Contas da União (TCU) e ficaram para este ano. Por um prazo de pelo menos três anos para os investimentos serem realizados, o Brasil sofrerá com o constante risco de filas de caminhões nas estradas e de navios a espera da carga no porto.

"Daqui um tempo, os agendamentos e outras soluções paliativas não darão mais conta do volume que precisa ser embarcado", afirma Meirim.